O pastor Silas Malafaia atingiu novos patamares de descolamento da realidade política e jurídica brasileira ao ameaçar o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, com um suposto tribunal divino. Sua declaração – “o senhor vai dar conta ao Deus que diz crer” – não é apenas uma bravata religiosa: é a expressão acabada de um fundamentalismo que confunde púlpito com Estado, fé com lei, e delírio com realidade.

1. A ameaça que ignora três séculos de Estado Laico

Malafaia age como se vivêssemos em uma teocracia neopentecostal, onde:

  • Procuradores deveriam se ajoelhar diante de pastores, não à Constituição;
  • Processos judiciais se resolveriam com “revelações divinas”, não com provas;
  • O “Deus” de Malafaia substituiria o STF como instância máxima de apelação.

O problema? O Brasil é um Estado laico desde 1891 – e a PGR responde ao povo brasileiro, não a autoproclamados “porta-vozes do céu”.

2. A falsa equivalência entre fé e Justiça

Ao sugerir que Gonet “prestará contas a Deus”, Malafaia:
✔ Equipara um processo legal (com contraditório, ampla defesa e provas) a um julgamento metafísico sem regras;
✔ Despreza o trabalho técnico de investigadores, peritos e juristas;
✔ Reduz a complexidade democrática a um maniqueísmo infantil de “servos de Deus” vs. “inimigos da fé”.

Ironia cruel: O mesmo pastor que exige “respeito às instituições” quando investigado é o primeiro a deslegitimar essas mesmas instituições quando não lhe servem.

3. O dado concreto que desmonta o delírio

Enquanto Malafaia fala em “prestações de contas divinas”, a realidade mostra:

Discurso de MalafaiaFato Real
“Deus julgará o PGR”Gonet tem 32 anos de carreira, aprovado pelo Senado com 61 votos
“Estão perseguindo cristãos”Seu império religioso faturou R$ 280 milhões em 2023 (Fonte: MPF)
“A Justiça é parcial”STF rejeitou 100% dos recursos de Malafaia em 2024

4. O fundamentalismo como fuga da accountability

A estratégia é clara: quando as leis terrestres o apertam, Malafaia:

  1. Sobe o tom apocalíptico (“Deus vai julgar!”);
  2. Vitimiza-se (“perseguição religiosa!”);
  3. Mobiliza sua base contra as instituições.

Efeito colateral: Seus seguidores passam a ver:

  • Juízes como “instrumentos de Satanás”;
  • Provas como “armações”;
  • Derrotas judiciais como “prova de fé”.

Por que isso importa?

Malafaia não está só “rezando”. Está:
🔴 Erodindo a confiança nas instituições;
🔴 Preparando o terreno para violência (“se a Justiça é do diabo, podemos desobedecer”);
🔴 Testando até onde pode ir antes de sofrer consequências.

Último ato da farsa: Enquanto ameaça o PGR, seus advogados correm para protocolar recursos técnicos no STF – ou seja: no fundo, sabe muito bem que só a lei real pode salvá-lo.

Nota Final:

Malafaia pode até fingir que vive em um mundo onde “Deus” substitui a Constituição. Mas a boa notícia é: não vivemos. E enquanto houver Ministério Público, imprensa livre e sociedade vigilante, seus delírios autoritários continuarão batendo de frente com a dura e luminosa realidade da lei.

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